quarta-feira, 14 de outubro de 2009

CHINQUILHAS A PRESIDENTE

Ao ser humano não interessa saber
o que é de mais ou o que é de menos,
mas ter a noção de suficiente.

CHINQUILHAS A PRESIDENTE
(História da estupidez do quotidiano)

Como todas as histórias para crianças, devia começar por, “era uma vez”!... Porém, esta vai ter um início diferente, porque o mundo mudou e os reinos de fadas também faliram.
Rui Chinquilhas* da Silveira, seu nome de baptismo, em tempos idos também conhecido por “Queixinhas”, vitupério que auferiu devido à sua patética maneira de ser, viveu numa remota aldeia transmontana, algures numa das encostas da Serra do Larouco, onde as torgas e as carquejas que ladeavam as bordas do único caminho que dá acesso ao pequeno povoado, sideradas pelo calor estival, estalavam sob os pés de quem passava. A povoação não era muito grande, constituída por umas centenas de almas que, algumas movidas pela sua boa fé e por algum papaguear manhoso que lhe palravam aos ouvidos já meio moucos da velhice ou sonhadores pelo temporão amadurecimento da idade, ainda acreditavam nos “milagres” dos politiqueiros, de boca aberta e coração cheio de esperança.
A família do Chinquilhas até gozava de alguma consideração social para a época, porque eram donos de “avantajados” regos, (em Trás-os-Montes, muitas propriedades) entre courelas, lameiros, poileiras**, bardos e socalcos. Enfim, viviam medianamente, em relação ao grosso da população e até eram pessoas de bem, o que não obsta para uma boa figueira não dê figos fanados.
Neste meio foi criado o Chinquilhas, com mais afagos do que os outros da sua idade e quando entrou para a Primária, já se mostrava um estupidozinho armado em dirigente não impedindo no entanto as correntes neuronais do seu intelecto de funcionarem mal; mas os pais, contemplavam ali um grande crânio, um fora de série, um prodígio – a velha história da águia e a coruja.
O Chinquilhas foi crescendo naquele irreal ambiente onde não sentiu o aperto tenaz e persistente dos calos da vida e o rilhar do cinto da necessidade, iniciou os estudos secundários, sempre embevecido pela vaidade e por uma puerilizada obstinação, sua fiel sombra pela vida fora.
Um belo dia, para ver se lhe limavam os miolos e desconhecendo que o que é genésico é irreparável, os pais resolveram expedi-lo para os “altos estudos” numa academia ou instituto do nosso país onde também os burros têm acesso e alguns, como o Chinquilhas, entre a cabulice e o encornanço lá conseguiu um canudozeco cuja licenciatura (?) apenas lhe permitia ver Braga e farejar um emprego cinzento como funcionário público, que pela saturação no sector lhe angariou o lastimável posto de “trabalhador” desempregado.
O Chinquilhas, a quem um acidente da Natureza retirou a inteligência, começou então por meter a sua mediocridade na política, a tábua de salvação de avantajado número de incompetentes, na tentativa de “singrar” na vida, como muitos iguais a ele têm apostado e até conseguido.
Em determinada altura surgem as eleições autárquicas para o seu povoado e ele resolve candidatar-se à presidência da autarquia local a favor de um partido na altura existente, ao qual há anos vinha prestando vassalagem através da sua filiação e militância activas, que demonstravam uma subserviência doentia, próxima da loucura do fanatismo.
Com ideias flutuantes muito acima da realidade, promessas ad hoc, ataques aporcalhados e distorções da verdade, lá conseguiu subir ao podium com uma margem que, apesar da fraca dimensão, não era acreditada.
Alguns, no efervescente barulho do seu silêncio, calados como ratos, gritavam em profundo solilóquio:
- Chinquilhas a presideeente!... Chinquilhas a presideeente!... Chinquilhas a presidente, carago!? Ele dá tudo, há que aproveitar!
É caso para evidenciar o velho ditado: “quanto mais burro, mais peixe”.
Empossado da realidade da vitória, lá foi, de peito inchado pela empáfia, cambaleando ébrio de prosápia e “imponente” caturrice, próprias de um dromedário, tacteando as areias movediças no deserto da sua iniciação de representante tentacular do governo central, que na sua débil ideia, pensava ele, eram de fácil transposição.
Porém, o tempo ia passando e as suas promessas por cumprir eram arredadas para as bordas do manifesto eleitoral, que a muitos serviram de papel hegiénico.
Nas assembleias o povo começava a rugir:
- Onde estão os meus medicamentos de borla?...
- Onde estão as ajudas aos meus proventos familiares?...
- Então e a nossa rua?...
Por outro lado, a oposição em nome do povo, começou a apertar as tarraxas com a exigência da concretização das mesmas e o Chinquilhas, entre a sua voz efeminada e a gaguez nervosa, tremendo como um bancilho***, lá ia esgrimindo a sua paupérrima defesa em desespero de causa, em seu nome e da sua congregação.
A dada altura, as grilhetas apertaram tanto, que ele, o Sr. Presidente Chinquilhas, não aguentou a pressão e resolveu abdicar do “trono” onde assentava a sua ingloriosa glória.
Subiu mais alto do que o seu poder intelectual permitia e… o tombo foi grande!
Foi o Sr. Presidente Chinquilhas e acabou ser o vulgar e desprezível “Queixinhas” de sempre, voltando à estaca zero.


António Figueiredo e Silva
Coimbra

*Leia-se Tchinquilhas.
Por ironia do destino, este vocábulo transmontano
é sinónimo de pessoa de baixo préstimo moral, despersonalizada
com miolos fragosos e rica em tramela.

**Baldios.

***Palavra da minha terra, que se dava aos vimes
com que se atavam as paveias (molhos) de qualquer coisa.

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