segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

SÓ ME FALTAVA MAIS ESTA!? (Desaforos de um "Peste Grisalha")

SÓ ME FALTAVA MAIS ESTA!?
(Desaforos de um “Peste Grisalha”)


Era época de Natal e fazia um frio de rachar, porque na noite anterior a serra havia sido coberta por um alvo manto de neve fofa como algodão. Um vento furioso e cortante como lâminas, zunia com grande bolina a demarcar a sua posição hibernal, obrigando-nos ao aconchego da lareira onde meia dúzia de achas atiçadas pelo fogo, zangadas crepitavam como que a refilar pela sua sorte, deixando porém, que a sua alma fumarenta galgasse pela velha chaminé, defumando os enchidos suspensos por um fio no pau de carvalho que a atravessava e subindo de seguida em direcção ao céu, em frenéticos e desajeitados corrupios que a ventania com retesado controlo comandava.                                                                                 
A mastigar umas castanhas assadas e a saborear um bom vinho amornado na pichorra, o serão prolongou-se; entre o bebericar e a tecelagem de dois dedos de conversa, o meu velho amigo, de cabeça branca como a neve, maleitosa de grisalhice, pousou o cotovelo sobre a mesa e, com sublime calma, assentou o seu queixo entre o polegar e o indicador; às vezes olhar a fogueira, outras a observar-me com um ar de concentrada tolerância e ao mesmo tempo de satisfação estampados na sua face enrugada, apossado de uma lentidão divina, cavaqueou assim:
 Muito antes da minha nascença, naturalmente que já por cá zarandeava alguma escória a infernizar a comunidade mais pacata deste país. Mas esta casta de “gente” não tem quedado a sua proliferação que actualmente se encontra num estado endemicamente avançado, ao ponto de, com extrema facilidade, se fisgar ao pau previamente ensebado, da coercividade da lei.
Quando germinei, medrei e já comia côdeas, ainda muitos desta ascendência andavam a andarilhar no cosmos genético testicular à espera que lhes fosse concedida uma oportunidade de avançarem para o engrossamento do monturo já existente, cujo direccionamento era criar dificuldades e desestabilizar a harmonia da sociedade já em si parcamente estabilizada. Muitos conseguiram-no. Melhor fora que, embrulhados num bocado de papel pardo de reles qualidade, houvessem tido o seu destino confinado ao fundo uma latrina, ou que tivessem tido o azar – sorte nossa – de terem sido desdenhosamente catapultados pelas pontas dos dedos de uma mão macia ou calejada, numa extasiada selagem da derradeira satisfação de uma lascívia que foi rapidamente saciada.
É precisamente dessa gentalha, que germinou desses andarilheiros testiculares que a nossa Pátria está contaminada; gente sem vergonha onde a capacidade de liderança é um fiasco mas que se alcandoram muito acima do que a sua parca inteligência permite; foi uma questão de sorte para eles e de infortúnio para nós.
Sim, vim a este mundo numa época inquietada pelas mais diversas razões como: o fim da segunda guerra mundial, que afectou Portugal – e o Mundo - com a escassez de produtos alimentares, a falta de assistência à sociedade no que se refere a cuidados de saúde e reformas, além de outra realidade que actualmente volta a fazer o seu ataque, porém com uma magnitude desenfreada, que é a exploração do homem pelo homem; apesar de toda a força - fraca – regulamentar instituída, o esclavagismo vergonhoso continua, porém com maior intensidade; os senhores do capital e da gerência incompetente deste bocado de terra continuam incólumes na sua marcha abrasiva para a destruição de todos os valores de bem que uma comunidade possa conter; impávidos e serenos, prosseguem a sua marcha como se estejam relaxadamente a fazer uma “caçada no pinhal do rei”, sem serem objectivamente beliscados.
Estatuem em seu proveito e tutelam-se entre si para a decomposição dos disparates que cometem sobre a capa pouco transparente da invulnerabilidade, mantida como um privilégio somente seu. Uma vergonha! Se sentem que não gostam das verdades que lhes são postas na mesa, não se limitam apenas em não comer, mas optam por todos os meios menos dignos, fazer desaparecer o cozinheiro. Gente onde o pudor se esvaiu no princípio da sua existência. Canalhas!
O que tem orientado esta gentalha não tem sido por certo a capacidade de raciocínio porque esta tem os seus limites, contudo a sua estupidez. Esta é frisada geneticamente e infinita na sua acção. Quer isto dizer que esta maltosa pertence sim a uma elite; uma elite depauperada de princípios.
E foi devido a estes princípios empobrecidos que eu, depois de ter atingido a grisalhice, me vi compulsivamente sujeito às regras de um Sinédrio a enfrentar as indagações dos drs. da lei, enquanto reflectia em mudo solilóquio: depois de tudo o que dei de mim pela minha Pátria e consequentemente pelo meu povo e depois de todos os revezes por que passei, SÓ ME FALTAVA MAIS ESTA!?
Sabes, tenho altivez e carácter suficientes para lhes perdoar, mas nunca esquecerei.
Eu, sou daqueles que… não se deixou ficar, para ser “atirado aos tubarões”.

António Figueiredo e Silva
Coimbra, 16/12/2016
www.antoniofsilva.blogspot.com




  



Sem comentários:

Enviar um comentário