sábado, 29 de abril de 2017

A IGUALDADE É UM PARADOXO




É falso que a igualdade seja uma lei da Natureza.
A Natureza não faz nada igual; a sua lei soberana
é a subordinação e a dependência.
(Luc de Clapiers Vauvenargues) 


A IGUALDADE É UM PARADOXO 


É uma realidade a referência publicitária que se tem formado à roda desta virtude, todavia, a sua existência é uma ilusão. A igualdade!
Clara quimera, só existente na cabeça de sonhadores, hipócritas, fanáticos, interesseiros e também de ignorantes.
Não há nada igual. A Natureza prima pela diversidade em todo o Universo e por tudo o que dele faz parte integrante. É graças a essa diversidade e à influência dela emanada, que se deve a existência do todo que nunca deixará de estar n convulsão até atingir a plenitude absoluta. Quando, não saberemos!? Porque a existência é o resultado dessa forma de luta cuja tendência é atingir a estabilidade, para isso, desestabilizando-se entre si.
Nem o ser humano, apesar de pensar que pensa, está arredado da lei da Diversidade Universal e consequentemente dos fenómenos que a regem, onde se torna necessário a aniquilação de uma matéria para dar origem a nova matéria não igual, todavia energeticamente equivalente.
Ora, se a própria matéria nunca é igual uma vez que está sempre sofrendo mutações no cerne das estruturas electromagnéticas que a compõem, mantendo apenas e indefinidamente a sua equivalência energética, como podem ser iguais as coisas por ela formadas?
Nunca o serão. É que, no Universo não há uma criação de matéria – no sentido volumétrico e quantitativo - mas sim uma transformação da matéria já existente.
Atendendo a essas transformações que são uma realidade verificada cientificamente, forçado me vejo a concluir que não existe nada igual, nem mesmo dentro do mesmo género; a exemplificar, no caso do ser humano, nem no género nem na maneira de discernir, de actuar, nem no seu patamar social. Tudo o que cada um é, é decorrente da matéria que o constitui.
Cada um é ele próprio, com todos os defeitos e virtudes, protegido por uma imutabilidade absoluta e como tal, inconfundível.
Se analisarmos friamente e despidos de preconceitos, nem nos direitos existe a igualdade, de que à boca-cheia tanto se faz alarde. O homem apenas pode tentar aperfeiçoar as qualidades boas ou más do carácter com que foi concebido, mas nada mais. Se nasceu com uma “assimetria” na sua maneira ser, morrerá com ela, seja qual for a sua posição social, que vai desde o pobre diabo ao mais destacado cientista.
Não havendo uma uniformidade absoluta, que não há, como poderá haver um resultado de igualdade? É impossível.
Se dissecarmos este raciocínio – que mais parece um paradoxo – friamente e despojados de preconceitos, chegamos à triste e inegável - contudo real - conclusão, que até nem nos direitos, nem nos deveres essa igualdade existe; no entanto, o seu pregão é um facto utilizado pelas mentes oportunistas onde o fingimento e o convencimento ocuparam o lugar da consciência e da razão. É querer mostrar a lisura de um caminho, quando os sulcos ainda estão por aplainar.
Porém, quem apregoa a igualdade, tem bem a noção da realidade da não existência mesma, mas fá-lo por conveniência própria, sendo bastantes os factores que levam à “defesa” desta concepção, por natureza irrealizável e ausente. A promoção social, o cinismo, a hipocrisia, a vaidade o egocentrismo, a fanatização da própria consciência, fazem parte do capote de fingida despretensão com que o ser humano asperge a noção quimérica de igualdade sem vida, que nunca existiu, nem na cabeça de quem a divulga.
No entanto ainda há quem acredite em demagogos e falsos profetas, submetendo” inocente ou compulsivamente” a sua vontade á metáfora “todos diferentes, todos iguais”, sabendo de antemão que esta teoria não tem nada de verdade, mas sim, de oportunismo.
É a este estado de coisas que eu com aferroado cinismo e afincada convicção, chamo de: IGUALDADE, UM PARADOXO SOCIAL.

António Figueiredo e Silva
Coimbra, 28/04/2017




segunda-feira, 24 de abril de 2017

ANIMAIS (O CÃO)

Recolha um cão de rua, dê-lhe de comer
 e ele não o morderá; eis a diferença
 entre o cão e o homem.
(Mark Twain)

ANIMAIS
(O cão)

É o ser mais dócil, mais tolerante e mais grato, que em toda a minha vida conheci. Apesar de não falar consegue transmitir o seu estado de espírito através da expressão “facial”, vincando aquilo que sente, à laia de napolitano, com as diversas posições do rabo. Contudo, mesmo rosnando ou ladrando, que é a coisa mais natural que sabe fazer, é muito mais fácil compreendê-lo do que ao homem, seu incontestável rival.
Diversas vezes o cão é abandonado, desprezado, mal tratado e, perdoando, continua a lamber as botas ao seu dono ou a quem ele pense que o é. Tenho pensado vezes sem conta, que talvez o homem sinta inveja da maneira de ser do cão, e por isso o despreze tanto. Se quando Deus criou o homem lhe tivesse incutido o senso do cão, de certeza que o mundo se apresentaria de maneira diferente!... Talvez mais humano em vez de mais canino. E digo canino, porque se na boca do homem fossem semeados dentes de cão, andaríamos todos mordidos ou até mesmo mutilados. Ele só não é mais cão porque não pode; a sua construção física não dá para isso, mas a psicológica é suficiente para muito mais.
O homem não respeita o seu semelhante, os seus chefes, as suas leis, na forma de direitos e deveres; é pior do que o cão, porque até nem a ele mesmo se respeita. O cão sabe qual a sua posição na hierarquia da matilha, conhece o seu semelhante, respeita-o e obedece-lhe e até faz o favor de gostar do seu dono, quando o tem, independentemente da fartura ou da miséria em que ele esteja metido.
Muito admiro este animal. O cão mostra ao homem que tem mais de humano, do que homem tem de cão.
O homem, numa posição mesmo que baixa, é traiçoeiro e procura não lamber as botas a ninguém; antes pelo contrário, tenta morder-lhas. E se as lambe já não é homem, mas um ser servil, que o situa num universo muito abaixo do cão.
Com o seu olhar dócil e o rabo a meia haste, abanando a cauda e saltando ou com o seu olhar esbugalhado, orelhas erectas, rabo no ar, pêlo crispado e dentes à vista ou ainda caminhando de cabeça baixa com o rabo entre as pernas, podemos contar que naquele momento ele está presente sem fingimentos, pronto para o que der e vier, de bem ou de mal.
Nada disto se passa com o homem!? Quantas vezes ele vem de “rabo” entre as pernas, submisso, solícito, simpático, com cara de sofredor e traz uma “faca no bolso”!... Quantas vezes ele sorri até fazer doer os músculos das orelhas – quem tem só orelhas – e no seu interior é só veneno, insensatez, inveja e velhaquice?
O cão não é assim; faz tudo para agradar ao homem, se bem que este não faça nada para agradar ao cão, nem ao menos imitar a sua maneira de ser.
Se eu mandasse faria uma inversão de dons. Poria o homem a ladrar e o cão a falar. Acreditem que ele tinha muito para dizer, deixando o homem despido de toda a sua imbecilidade.
Muito mais teria para dizer sobre as virtudes desse nobre animal, mas penso correr o risco de ser mordido pelo homem. Mesmo assim, quero aqui prestar a minha sincera homenagem ao cão, sem distinção de raças, porque ele conhece melhor o homem do que o homem conhece o cão.
Só por isto, o cão merece.


António Figueiredo e Silva
Coimbra, 03/08/2003


quinta-feira, 20 de abril de 2017

ILUSÕES (?) (Anseios de mentes humanistas)

Uma sociedade só é democrática quando ninguém
for tão rico que possa comprar alguém e ninguém
seja tão pobre que tenha a que se vender a alguém.
(Jean-Jacques Rousseau)
 

ILUSÕES (?)
(Anseios de mentes humanistas)

Foi meu companheiro na Força Aérea Portuguesa; comungámos de muitas dificuldades durante a crise então instalada, decorrente da guerra em Moçambique e da desorganização que campeava nas forças armadas, que nessa altura era um verdadeiro cozido-á-portuguesa, até serem criadas as condições mais ou menos sustentáveis para a nossa “pequena” estadia no norte daquela terra situada no fim do Mundo.
Conversávamos bastante nos momentos de lazer à sombra da bananeira”, em que ele, mercê do seu pensamento filosófico – que ainda hoje mantém – com um onirismo bem enraizado e indestrutível, atirava cá para fora, como actualmente faz, em palavras marginadas de beatífica convicção, realidades cuja concretização, à sua nascença, se afundam no espaço da impossibilidade absoluta.
Interiorizou no centro do seu campo cognitivo, que o mundo tem tendência a mudar para melhor, atribuindo esta mutação a uma consciencialização global a nível dos governantes e dos grandes poderosos, onde o dinheiro vai deixar de existir e será retomado o sistema de permuta e entreajuda em todas as necessidades, acabando deste modo com a ambição materialista, a causa primária de toda a desordem instalada na Comunidade Humana Global.
- O dinheiro não é preciso – diz.
Lá vai a minha interrogação enfática e concisa, lógica, e pertinente:
- Então para que queres tu, o dinheiro?
- Tenho de o ter, porque mo pedem, se não, não teria necessidade dele para nada!?
Argumenta ainda, que o Homem erra por ignorância congénita, porém, à medida que se vai apercebendo dos erros que faz, vai naturalmente clivando a sua maneira de ser, de ver as coisas de maneira diferente e certamente não irá cair nos mesmos erros, uma vez que conclui que estes são funestos.
Bem, eu já não penso da mesma maneira, mas reconheço a nobreza de espírito deste meu amigo, que deixa transparecer um manancial de boas intenções, das quais está repleto mundo, não sendo porém, estas usadas na prática.
Por esta linha de ideias, está severamente convencido de que, já não no tempo da sua (nossa) vivência, porém num futuro próximo, essa consciencialização colectiva – intitula ele - emergirá do espírito selvagem que até agora pisoteia a sociedade e dará origem a um paraíso na terra, em que todos possamos viver em tranquilidade e exultação.
Argumenta ele, que o Mundo em que vivemos, em si, já é um paraíso, se bem que nós não tenhamos disso perfeito entendimento, resultando daí a incapacidade de podermos usufruir dessas dádivas que muito naturalmente estão ao nosso alcance.
Qual é o motivo que pode legitimar porque é que no meio de tanta abundância, existe tanta miséria? Inquire. Somente porque é do interesse dos poderosos e dos governantes, aleitar a fome e a miséria, resultando daqui a necessidade de sobrevivência – argumenta; daí, brotam os monstros da desgraça: a instabilidade social e a guerra.
Com uma consciencialização purificada isto daria para todos e sobrava para muitos. A boa vivência está garantida por natureza; o que busca cada ser humano é viver bem e em paz; por isso o que tem promovido a guerra? Como podemos ver, unicamente a parte material o tem legitimado. É a ambição pelo dinheiro que tem abafado a possibilidade da harmonia paradisíaca entre a Comunidade Humana.
Esta ambição materialista tem partido sempre dos grandes e dos poderosos, que têm sido um mau exemplo para os seres “rastejantes” que eles comandam com pulso de ferro, apesar de muitos deles se abrigarem sob uma democracia e igualdade de direito fraudulentas, onde a paridade não existe, - arremata.
Ele pensa assim.
Eu, o que hei-de cogitar?
Oxalá que seja realizado este presságio, que eu, com acentuado cepticismo questiono!?
No entanto, não deixo de não dar razão à reflexão de *Jean-Jacques Rousseau, “É na desproporção entre os nossos desejos e as nossas faculdades que consiste a nossa miséria. Um ser sensível cujas faculdades igualassem os desejos, seria um ser absolutamente feliz”, e, naturalmente, às concepções do meu amigo Alberto Baptista.


António Figueiredo e Silva
Coimbra, 13/04/2017

*Nasceu em Geneve, Suíça, em 1712.
Foi um importante filósofo, teórico político, escritor e
compositor autodidacta; é considerado um dos principais
 filósofos do iluminismo.
O estado da Natureza, concepção sua, está descrito no
seu livro, Discurso sobre a Origem e os Fundamentos
da Desigualdade entre os Homens.